RESUMO: Com seu festival de cores, Meu Pedacinho de Chão correu o risco de ficar teatral, mas o autor Benedito Ruy Barbosa e o diretor Luiz Fernando Carvalho conseguiram fazer com que a trama fosse ágil, sem atropelar a emoção. A preparação prévia dos atores, marca do trabalho de Carvalho, resultou em boas surpresas, como a interpretação de Juliana Paes, que está em seu melhor papel na TV
Quando da estreia, toda a plasticidade proposta pela direção de Meu Pedacinho de Chão (Globo) corria o forte risco de deixar a novela teatral demais. Foi uma ousadia apostar que o festival de cores e texturas pudesse dar certo, e o resultado não podia ter sido melhor. A trama de Benedito Ruy Barbosa, dirigida por Luiz Fernando Carvalho, é puro lirismo em forma de teledramaturgia.
Oxigenar o gênero, tão travado por causa do ritmo industrial de produção, é fato raro nas telenovelas brasileiras. Por isso é louvável a iniciativa de trazer para a narrativa novos recursos, como as animações, que contribuem para dar um quê lúdico e casam muito bem com a proposta da trama.
A agilidade de Meu Pedacinho de Chão não atropela a emoção da narrativa. A transformação de Zelão (Irandhir Santos), de um homem bruto e rústico em um sujeito aprumado e disposto a conquistar o amor da professora Juliana (Bruna Linzmeyer), foi de uma delicadeza incrível, mas, na sequência em questão, ficou evidente a mão do diretor, que, de modo algum, comprometeu o texto.
Obviamente, há um certo exagero nas imagens, como o desfoque provocado em algumas cenas e que causa estranheza e incômodo, mas nada que prejudique o resultado final.
Rodrigo Lombardi é o único a errar a mão no sotaque caipira de Pedro Falcão
Luiz Fernando Carvalho também é conhecido pelo trabalho de preparação que faz com o elenco, antes de estrear qualquer produto que leva sua assinatura. O resultado é uma maior naturalidade dos intérpretes, que conseguem compor com maior exatidão seus personagens.
No caso de Meu Pedacinho de Chão, isso fica claro quando analisamos dois personagens em especial: o garoto Serelepe (Tomás Sampaio) e Catarina (Juliana Paes). Apesar da pouca idade, Tomás é simpático e carismático. Já Juliana deixou totalmente de lado a sensualidade que a caracterizou em papéis anteriores e tem em mãos a melhor personagem de sua carreira. Ela transita entre a doçura da mãe zelosa e momentos de pouca lucidez. Surpreendeu.
A prosódia caipira é ainda uma das marcas das novelas de Benedito Ruy Barbosa e, em Meu Pedacinho de Chão, ela não ficou de lado. Até mesmo a trilha sonora arrojada, com temas instrumentais, contribui para a beleza da novela, com o contraste causado pelo acento interiorano. Mas fora de tom, Rodrigo Lombardi é o único que destoa do restante da trama. O ator imprimiu um sotaque forçado e pavoroso, emitindo grunhidos mais do que estranhos para o seu Pedro Falcão.
A curta duração da história também é outro ponto de destaque. Reivindicação antiga dos autores de novela, tramas concisas são mais ágeis e sem muita lengalenga. Do ponto de vista comercial, podem ser um problema para as emissoras, mas o público se mostrou receptivo a Meu Pedacinho de Chão. A trama foi uma aposta alta da Globo, mas certeira.
Com pouco mais de um mês pela frente, a novela está longe de ser um fenômeno de audiência. Sua principal qualidade tem sido a de ter resgatado a magia para o folhetim. Seja pela dramaturgia do experiente Benedito Ruy Barbosa ou pela ousadia estética de Luiz Fernando Carvalho, Meu Pedacinho de Chão está sendo uma trama mais do que encantadora.